Selic: os impactos da alta dos juros no agro, mercado de trabalho rural e outras formas de combate à inflação

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A Taxa Selic (Sistema Especial de Liquidação e Custódia) é a taxa básica de juros da economia brasileira, definida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil. Trata-se de um dos principais instrumentos da política monetária, cujo objetivo central é controlar a inflação, regular a oferta monetária e influenciar o nível de atividade econômica. A Selic serve como referência para todas as demais taxas de juros praticadas no país, afetando diretamente o custo do crédito, o consumo das famílias, o investimento das empresas e o financiamento da dívida pública.

Tecnicamente, a Selic é a taxa média ajustada dos financiamentos diários e lastreada aos títulos públicos federais. Em outras palavras, é a remuneração dos empréstimos de curtíssimo prazo entre instituições financeiras, com garantia desses títulos. Sua importância deriva do fato de que, ao alterar a Selic, o Banco Central influencia todo o sistema financeiro nacional, impactando o comportamento de agentes econômicos e, por consequência, a trajetória do Produto Interno Bruto (PIB) e da inflação.

A elevação da Selic tende a conter o consumo e o investimento, pois encarece o crédito, tornando financiamentos e empréstimos menos acessíveis. Com menor demanda agregada, espera-se um arrefecimento das pressões inflacionárias. Por outro lado, a redução da Selic visa estimular o crescimento econômico ao baratear o crédito, fomentar o consumo e facilitar o investimento produtivo. A política monetária, nesse contexto, torna-se uma ferramenta de estímulo à atividade econômica, sobretudo em cenários de desaceleração ou recessão.

Além disso, a taxa Selic afeta diretamente o custo da dívida pública. Juros mais altos significam maior despesa com o pagamento dos encargos da dívida, pressionando o orçamento público e limitando o espaço para políticas sociais e de investimento.

Pertinência da baixa da Selic

Defender a redução da Selic é especialmente pertinente em contextos de baixo crescimento econômico, elevado desemprego ou quando a inflação está controlada e dentro das metas estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Há três argumentos centrais para justificar esse posicionamento:

  • Estímulo ao crescimento e ao emprego: Taxas de juros elevadas desincentivam a produção e o consumo. Ao reduzi-las, cria-se um ambiente mais propício à expansão das atividades econômicas, ao aumento da renda e à geração de empregos. Isso é crucial para países com elevado índice de desigualdade social e forte demanda por políticas de inclusão e desenvolvimento, como é o caso do Brasil.
  • Eficiência fiscal e sustentabilidade da dívida pública: Uma Selic mais baixa reduz o custo de rolagem da dívida pública federal. Isso alivia o orçamento do governo, possibilitando maior investimento em áreas estratégicas, como saúde, educação, infraestrutura e políticas de transferência de renda, também, como é o caso do Brasil.
  • Inexistência de pressões inflacionárias: Em determinados contextos, como em momentos de desaquecimento econômico global ou queda nos preços das commodities, a inflação pode se manter abaixo da meta mesmo com juros mais baixos. Nestes casos, manter a Selic em patamares elevados configura um entrave desnecessário ao desenvolvimento.

A taxa Selic cumpre um papel crucial na regulação da economia brasileira, mas seu uso deve ser equilibrado e coerente com os objetivos sociais e econômicos do país.

Impactos no agronegócio e mercado de trabalho rural

A elevação da taxa básica de juros, possui efeitos significativos sobre o agronegócio brasileiro. Como grande parte das atividades do setor depende de financiamento — especialmente para aquisição de insumos, máquinas, custeio de produção e investimentos em infraestrutura — o aumento dos juros encarece o crédito rural. Isso desestimula pequenos e médios produtores, que enfrentam maior dificuldade de acesso ao crédito bancário, reduzindo a capacidade produtiva e os investimentos em inovação.

O agronegócio, apesar de ser fortemente voltado à exportação, é sensível às variações de custo de produção. Com juros mais altos, o custo de capital se eleva e os produtores tendem a postergar investimentos e modernizações, o que compromete a competitividade no médio e longo prazo. Isso afeta não apenas a produtividade, mas também a geração de valor agregado no setor.

Impactos no mercado de trabalho rural

No que tange ao emprego, o aumento da Selic impacta negativamente o mercado de trabalho rural. A retração nos investimentos e na produção acarreta menor demanda por mão de obra temporária e permanente, afetando principalmente os empregados(as) assalariados(as) rurais, que já se encontram em situação de vulnerabilidade. A redução da atividade econômica no campo também prejudica os setores correlatos, como transporte, agroindústria e comércio local.

Em síntese, a política de juros elevados compromete a dinâmica de crescimento do agronegócio e impõe obstáculos ao desenvolvimento do emprego no meio rural, intensificando desigualdades regionais e sociais.

Outros mecanismos de combate à inflação (perspectiva desenvolvimentista)

A perspectiva desenvolvimentista propõe um enfrentamento da inflação que vá além da simples elevação da taxa básica de juros (Selic), privilegiando instrumentos que preservem o crescimento econômico, a geração de empregos e a expansão dos investimentos públicos e privados. Nesse enfoque, a política monetária não deve operar isoladamente, sob o risco de produzir efeitos recessivos e ampliar as desigualdades sociais.

Em vez de recorrer de forma excessiva ao encarecimento do crédito, os desenvolvimentistas defendem o uso articulado da política fiscal, cambial, industrial e regulatória. No campo fiscal, o combate à inflação pode ser promovido com maior eficiência da gestão pública, controle de gastos ineficientes e aumento da progressividade tributária. Assim, evita-se o corte indiscriminado de investimentos sociais e em infraestrutura, essenciais para o desenvolvimento sustentado.

Na esfera cambial, uma política de valorização moderada da moeda pode ajudar a conter os preços de produtos importados, como combustíveis e insumos industriais, reduzindo a inflação de custos. Contudo, isso deve ocorrer com equilíbrio, para não comprometer a competitividade das exportações e a indústria nacional.

A política industrial e agrícola também tem papel central. O estímulo à produção interna de alimentos, energia e bens essenciais reduz a vulnerabilidade a choques de oferta e evita aumentos abruptos de preços. Investimentos públicos em logística, transporte e armazenamento contribuem para a eficiência das cadeias produtivas e ajudam a conter repasses inflacionários ao consumidor final.

Adicionalmente, a regulação de setores estratégicos, como combustíveis, energia e telecomunicações, pode prevenir aumentos abusivos de preços. O fortalecimento de estoques reguladores e o incentivo à agricultura familiar e à produção local são ferramentas eficazes de estabilização de preços.

Sob a ótica desenvolvimentista, portanto, o controle da inflação deve ser compatível com os objetivos de desenvolvimento econômico e social. A simples elevação da taxa Selic, além de seus impactos negativos sobre o investimento e o emprego, representa uma solução limitada e regressiva.