MPT: Trabalhadores são resgatados de condições análogas à escravidão em Guatapará (SP)

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Foto: MPT

Vítimas moravam em casebre sujo de um cômodo, sem energia elétrica, e tinham que buscar água potável no rio; operação conjunta do MPT, PF e Ministério do Trabalho providenciou o resgate dos trabalhadores

Uma operação conjunta do Ministério Público do Trabalho (MPT), Polícia Federal e Ministério do Trabalho e Previdência (Gerência Regional do Trabalho em Ribeirão Preto), que teve início em 08 de outubro, resgatou dois trabalhadores de condições análogas à escravidão em uma fazenda na cidade de Guatapará (SP), localizada na região conhecida como “Aterro do Varjão”, a 70 km de Ribeirão Preto.

A denúncia foi remetida ao MPT em Ribeirão Preto pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, que a recebeu de forma sigilosa pelo Disque 100. A partir da notícia, a Procuradoria acionou a fiscalização do trabalho e a Polícia Federal, dando início à operação.

As vítimas trabalhavam no trato do gado e na construção de cercas na propriedade, e moravam em um casebre de único cômodo que fica dentro da fazenda, de propriedade de Maurício Juno Guerino, identificado como o empregador direto dos obreiros.

Os trabalhadores não tinham registro em carteira de trabalho e não recebiam salários ou qualquer direito previsto na lei (FGTS, férias, 13º salário, etc). Viviam da promessa de algum rendimento a ser pago pelo empregador. Ficavam sujeitos a acidentes e doenças ocupacionais, uma vez que não lhes eram fornecidos equipamentos de proteção individual.

O alojamento era bastante precário, apresentando péssimas condições de higiene e conservação. O cômodo que servia de moradia para as vítimas também era usado como depósito de ferramentas e produtos de uso da propriedade rural. Havia no local sacos de sal para alimentar o gado, ferramentas, como uma foice, e recipiente de pulverização de vermífugo no gado. O cômodo era frequentado por galinhas, cães e gatos que habitavam por ali.

Não havia armários para abrigar os pertences pessoais dos trabalhadores. Todos os objetos pessoais se encontravam espalhados pelas camas rústicas, guarnecidas com colchões em mal estado de conservação. A única janela do cômodo estava com o vidro quebrado, comprometendo a vedação, permitindo entrada de animais e do vento frio durante a noite.

Havia um fogão com botijão de gás GLP no mesmo cômodo em que estavam as camas e onde dormiam os trabalhadores, sem qualquer barreira divisória, prática proibida em razão do risco da ocorrência de acidentes com vazamento de gás e perigo de incêndios. Não era disponibilizado local adequado para preparo de alimentos. A refeição do almoço, segundo relatos dos trabalhadores, tinha preparo externo em alguns dias, e era recebida no local. Mas para os dias em que a refeição não era recebida pronta e para as outras refeições do dia, como café e jantar, os trabalhadores tinham que prepará-la utilizando o fogão que ficava no cômodo onde dormiam, em meio às roupas, ferramentas e outros objetos que permaneciam no local. O alojamento não tinha pias, mesas ou balcões.

Para consumir água, as vítimas tinham que buscá-la no rio ou em posto de combustíveis próximo da propriedade rural. Embora houvesse uma geladeira em mal estado de conservação e higiene, o local não era servido por energia elétrica, impedindo a refrigeração e comprometendo a conservação. Também não era disponibilizado recipiente ou caixa térmica, ficando os alimentos submetidos às altas temperaturas do ambiente, aumentando o risco de contaminação dos trabalhadores. Não eram disponibilizadas roupas de cama. O transporte desses dois trabalhadores era realizado por meio de um caminhão sem para-brisas, e um deles dirigia o veículo, mesmo não possuindo habilitação para tal.

Providências – Os auditores fiscais aplicaram autos de infração de resgate por condições análogas à escravidão, trabalho degradante e por questões relativas à saúde e segurança e legislação do trabalho. Com a medida, os trabalhadores têm o direito de receber o seguro-desemprego e as verbas rescisórias devidas.

Até o momento, o empregador se recusou a pagar os salários e benefícios atrasados e as verbas rescisórias dos trabalhadores. As vítimas, que são originárias de cidades da região, retornaram aos seus lares e estão aguardando o recebimento dos seus direitos trabalhistas.

O MPT deve ingressar com uma ação cautelar pedindo providências judiciais para o acerto das verbas devidas, e já encaminhou ofício à Defensoria Pública da União para que os defensores providenciem a documentação dos trabalhadores para o recebimento do seguro-desemprego.

Os documentos produzidos no inquérito do MPT serão remetidos ao Ministério Público Federal, para as providências criminais cabíveis em face do empregador. O crime de redução de trabalhadores à condição análoga à escravidão é tipificado no artigo 149 do Código Penal, e prevê pena de 2 a 8 anos de reclusão, além de multa.